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VENDE-SE
cotos de sabão secando nas margens do tanque,
frascos vazios e teias de aranha no parapeito das janelas,
algum fruto esquecido,
triste até à exaustão
dentro das gavetas naftalina,
peças brancas de linho, cambraias, lenços, os coturnos de lã
a esmo, no remanso de uma caixa de sapatos, os óculos,
os teus alfinetes, retratos ovais cor de sépia,
suponho que duas ou três algumas cartas,
não de amor mas dos filhos, do ultramar,
o bilhete de identidade com o dizer “vitalício”
alguém juntou tudo à pressa
fecharam os portões com arame e um cadeado grosso,
puseram à mostra, em letras gordas, a vermelho,
as palavras “vende-se”
depois veio da imobiliária uma moça loira, de minissaia
percebia bastante destas coisas,
torceu o nariz mais do que uma vez,
disse que da casa não era de esperar grande coisa
as saudades estão hoje ao preço da chuva